quinta-feira, 9 de julho de 2009

Estrangeiro

O estrangeiro é aquele que passa pela rua e observa todos os demais levando os livros das histórias de suas vidas debaixo do braço. Sentadas nos cafés e fumando seus cigarros, andando apressadas a caminho do trabalho, simplesmente passeando sem destino ou coçando o nariz, as pessoas abrem seus livros, contam suas histórias para si próprias e para os outros, mesmo sem necessidade, já que os ouvintes conhecem a ladainha de cor. O forasteiro também carrega seu livro. Mas não adianta: chega a passar vexame quando faz menção de abri-lo e ninguém vê o volume encadernado caprichosamente em couro, que encerra tantas aventuras que quase chegam a pular das páginas para o mundo. Aos olhos nativos, é como se ele tivesse acabado de nascer, ali mesmo, já no auge da maturidade, sem um pingo de passado. O próprio estrangeiro passa a não querer carregar mais aquele calhamaço que lhe parece cada vez mais pesado e inútil. Uma noite, com saudade da familiaridade, abre o volume e percebe que o texto ali escrito está em um idioma totalmente desconhecido para ele. Aquela intraduzível história é, no entanto, tudo que ele tem.

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