Depois disso, eu enchia um copo de leite com nescau e comia um sanduíche de queijo e presunto devidamente derretido e tostado na frigideira até que o pão de forma adquirisse aquela consistência mais rígida e ficasse escurinho no centro. Ao chegar no trabalho, ia até a máquina de café expresso, colocava a moeda e me inebriava com o cheiro do café recém-torrado. Enchia o copo de plástico de açúcar e chacoalhava. Acendia o segundo cigarro do dia. Nas duas horas seguintes, faria isso mais três ou quatro vezes, cada vez com menos prazer. Até a última, pouco antes do almoço, quando começava a sensação de envenenamento.
Desde o começo de fevereiro, tudo mudou. De manhã, acordo e como um prato cheio de frutas (geralmente, manga, mamão e o que mais tiver em casa). Depois, tomo iogurte e, no fim do mês, quando as compras acabam e a grana diminui, leite com granola. Não fumo nem antes nem depois. Não fumo nunca, mesmo. Ao chegar ao trabalho, bebo o mesmo café, mas em outro contexto. Com adoçante. Pouco direi sobre o resto do meu dia, no qual troco o macarrão com rabada do almoço por alface com peixe, para não entediar os leitores imaginários deste blog.
Meu corpo se ressente com a mudança. É como se me tirassem um órgão a cada dia que passa (a essa altura, só deve me sobrar o baço, que descobri ser um órgão recentemente, mas ainda não sei para que serve). Ele, meu corpo, bem sabe que o motivo dos meus sorrisos não era bem o Sol, a praia, a cerveja gelada e os seres bonitos que andam para lá e para cá com roupas mínimas. Meu sorriso era diretamente proporcional a Ela, a Dopamina, o neurotransmissor que poderia ter evitado o holocausto se circulasse pela cabeça daquele pobre bigodudo mal-amado (saiba mais aqui). O neurotransmissor que fez do cigarro, da cerveja, do sexo, do pão, do chocolate, coisas tão prazerosas aos olhos dos nossos geniosos neurônios.
Sem Dopamina, não enxergo o Sol nos ensolarados dias recifenses. Sem Dopamina não há sorrisos nem futuro, não há bom dia, a cerveja não faz mais que a obrigação, as mulheres bonitas apenas compõem a paisagem e o mar é uma poça de água suja. Sem Dopamina, Deus teria muito menos amigos, mesmo que ainda passeasse por aí fazendo milagres.
Pois é, pois é. Às 19h de anteontem, eu, com baterias de fogos de ódio estourando no meu cérebro, daquelas que levam alguém a atropelar velhinhas que atravessam a rua vagarosamente, peguei minha bicicleta e saí por aí. Rodei por alguns quilômetros. Andei pelas nostálgicas paragens do Poço da Panela e Apipucos (digite no Gooogle Images, please). Chacoalhei pelo chão de paralelepípedos. A cada pedalada, lá estava ela, a Dopamina, sendo bombeada para o meu cérebro saudoso-de-nicotina-açúcar-pão-chocolate-purê-de-batata-arroz-gororoba-com-tudo-misturado. Horas depois, quilômetros mais tarde, lá estava eu, satisfeito, sem motivo algum. Ou satisfeito por enxergar em miniatura os mesmos motivos que me faziam chorar. Ou por visualizar de maneira mais nítida as razões que antes eram microscópicas demais para me fazer sorrir.
Isso me leva à seguinte questão: o que pensamos, vivemos, sentimos, o que acontece com a gente, a sorte ou azar têm alguma importância, sem Ela, a Dopamina? Um sujeito que tem tudo na vida, com um déficit Dela, é mais feliz que outro, miserável em saúde, amigos, grana, rico apenas na quantidade de Dopamina circulando pelo cérebro? Se uma substância química (mal e porcamente produzida pelo nosso corpo) é o segredo da felicidade, nossa percepção do mundo é muito mais maleável do que jamais sonhei. Diante dessa (ir)realidade, a felicidade nada mais é que a prostituta dos sentimentos, a mais volúvel das guloseimas.
Pois é, pois é. Às 19h de anteontem, eu, com baterias de fogos de ódio estourando no meu cérebro, daquelas que levam alguém a atropelar velhinhas que atravessam a rua vagarosamente, peguei minha bicicleta e saí por aí. Rodei por alguns quilômetros. Andei pelas nostálgicas paragens do Poço da Panela e Apipucos (digite no Gooogle Images, please). Chacoalhei pelo chão de paralelepípedos. A cada pedalada, lá estava ela, a Dopamina, sendo bombeada para o meu cérebro saudoso-de-nicotina-açúcar-pão-chocolate-purê-de-batata-arroz-gororoba-com-tudo-misturado. Horas depois, quilômetros mais tarde, lá estava eu, satisfeito, sem motivo algum. Ou satisfeito por enxergar em miniatura os mesmos motivos que me faziam chorar. Ou por visualizar de maneira mais nítida as razões que antes eram microscópicas demais para me fazer sorrir.
Isso me leva à seguinte questão: o que pensamos, vivemos, sentimos, o que acontece com a gente, a sorte ou azar têm alguma importância, sem Ela, a Dopamina? Um sujeito que tem tudo na vida, com um déficit Dela, é mais feliz que outro, miserável em saúde, amigos, grana, rico apenas na quantidade de Dopamina circulando pelo cérebro? Se uma substância química (mal e porcamente produzida pelo nosso corpo) é o segredo da felicidade, nossa percepção do mundo é muito mais maleável do que jamais sonhei. Diante dessa (ir)realidade, a felicidade nada mais é que a prostituta dos sentimentos, a mais volúvel das guloseimas.
é muita dopamina, meu amorrr
ResponderExcluirviva dopamina, viva a felicidade!!!