As viagens, digo as boas e longas viagens, são sempre carregadas de uma sensação de perda iminente. O olhar não sabe se desfruta ou se se despede daquilo que possivelmente nunca mais voltará a ver. Barcelona, tão brilhante que é, acentua essa característica e me leva do riso às lágrimas em segundos.
Sim, entendo aqueles que colocam faixas nas janelas, protestando contra a multidão de turistas que ronda a cidade todos os dias. Aquilo não me pertence e, se pertencesse, eu faria o mesmo. Ah, mas é impossível não ser íntimo de uma cidade que faz das varandas o varal para suas roupas de baixo e seus gritos de guerra. Andar pelas apertadíssimas vielas do bairro gótico é como ser abraçado por todos esses anos de história e estórias.
Cidade ensolarada quando a Europa começa a congelar, salpicada pela mágica de Gaudí, confeiteiro da arquitetura, que parece usar chantilly e jujubas nas suas construções. A Casa Batlló é o mais comestível de todos os edifícios que já conheci. O arquiteto também era especialista em disfarces... ou sou o único a achar que a Sagrada Família é uma nave espacial disfarçada de igreja?
Essa atmosfera fantástica se espalha pelas ruas. Basta dar uma caminhada nas Ramblas para se surpreender com os artistas que até flutuar flutuam em praça pública; ou passear pelo mercado de Boqueria, onde são vendidas as comidas mais coloridas do mundo. No bairro del Raval, o sonho ainda não acabou na Casa des Pueblos Rebeldes, onde os seguidores dos anarquistas que enfrentaram o ditador Franco ainda continuam a arquitetar planos contra o demônio capitalista.
Difícil é deixar tudo isso depois de alguns poucos dias por lá. Mas não há varinha de condão tão poderosa que mude certas circunstâncias da vida ou que simplesmente faça Barcelona desaparecer. Da Catalúnia e da minha memória.
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